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Furando a bolha: (outras) faces da exclusão no pole dance



Por Naomi Cary


Na cena do pole dance, quando se fala em limitações, fala-se exclusivamente sobre limitações físicas e as exclusões de corpos não padrão. Tal prática, portanto, é colocada numa bolha onde raramente se discute a democratização e acesso à arte, através de um discurso falacioso em que a única coisa que a separa qualquer pessoa da prática do pole dance é ela mesma.


A crítica, pertinente, de que só há espaço no pole dance para corpos magros brancos e cisgêneros, não costuma vir acompanhada de um discurso sobre como a exclusão dos corpos está sempre numa relação de retroalimentação com a exclusão socioeconômica.


Então, furemos as bolhas.


Podemos facilmente perceber que a grande maioria des praticantes do pole dance são mulheres brancas, na maioria cisgêneras. Mas qual o problema?


A arte do pole dance foi inspirada em uma prática indiana antiquíssima chamada mallakhamb, que trabalhava força e equilíbrio, e que era mais praticada por homens do que por mulheres. Uma vez ressignificado pelo ocidente – através do circo e das artes burlescas – passou a ser estigmatizado como algo extremamente ligado à sensualidade cisheterossexual – quando falamos em pole dance, a imagem feita pelo senso comum é a performance típica de casas de strip tease.


Hoje, influenciado pelas teorias feministas, o pole dance tem sido colocado em um lugar de empoderamento, aceitação do corpo e bem estar físico e psíquico que, ao passo que importantes, são também discursos inacessíveis e, mais do que isso, simplesmente negados, à maioria da população periférica ou marginalizada – no sentido mais amplo desses processos. Por fim, se alguém ainda não estiver convencide, a inacessibilidade dos preços de equipamentos e localização da maioria das aulas é factual: uma barra de pole custa a metade do salário mínimo no brasil e a maioria das academias ficam nos centros e bairros com maior custo de vida.


Isso tudo se configura num processo fundamental do capitalismo em que culturas de outros países são esvaziadas de contexto histórico, construídas como exóticas, e assim, acessíveis para uma elite econômica e cultural, alienando e excluindo os grupos que não gozam de privilégios socioeconômicos daquela prática, através dos instrumentos já citados: preços e discursos inacessíveis.


O capitalismo se apropriou do pole dance, tornando ele inacessível para a maioria das pessoas, tornando algo quase que exclusivo da branquitude cisgênera. E agora? Eu, mina branca e cis, devo largar o pole? Não, mas você pode contribuir para que pessoas não brancas e não cisgêneras resistam e insurjam contra essa exclusão. Você pode dar bolsas de gratuidade e vagas exclusivas em cursos, encontros e congressos para pessoas não brancas e trans; promover debates e reflexões sobre privilégios e exclusões nesses espaços; construir redes de carona – pensando nas políticas racistas e classistas de transporte do Estado; e criar financiamentos coletivos para apoiar artistas não brancas cisgêneras que praticam pole dance.


Os esforços desse texto foram no sentido de conscientizar e convidar a cena do pole dance a questionar a falta de corpos não padrão em suas mais diversas causas e consequências, e mais, agir na transformação desse cenário.


 





Naomi é mãe, preta e bissexual, graduada em Ciências Sociais pela Universidade de Brasília. Participou de algumas coletâneas literárias e blogs de conteúdo escrevendo sobre dissidências, insurgências e resistências.


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